VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NÃO É SÓ ESPANCAR!!
Quem tem medo de Heloisa Helena?
Leonardo Boff
Teólogo
Nem chorar, nem rir mas procurar entender, eis a atitude filosofante que importa assumir face à expulsão dos dissidentes do PT, notadamente da senadora Heloisa Helena.
É enganador pensar que se trata apenas de uma questão disciplinar e que agora o partido marchará tranquilo e unido.
O desfecho da crise levanta o véu de uma questão de fundo que, se não for equacionda, pode pôr a perder a singularidade do PT e destruir as esperanças que suscitou.
Qual é a questão de fundo? É o caráter sacrificial e vitimatório de todas as instiituições auto-reguladoras.
Explico concretamente.
O PT se formou a partir de um sem número de sonhos, movimentos e propostas.
Era o caos inicial generativo, como nos dizem os formuladores da teoria do caos, fundamental para entender os processos vivos em todos os âmbitos.
Mas chega um momento em que deste caos se cria uma ordem, surge o partido e ele estabelece normas que irão regular suas relações internas.
Quem fere as normas cria novamente o caos. Então é enquadrado ou expulso para preservar a ordem establecida.
Repare-se a nuance: Recria-se a ordem mediante a desordem, mediante o sacrifício de alguém. Foi o que ocorreu com Heloisa Helena.
O partido se livrou dela, cometendo violência contra ela.
Todas as partes envolvidas sofreram, porque houve inegável laceração.
Poderia ter sido diferente?
Teóricos da violência institucional (René Girard e outros) afirmam: todas as ordens autoreguladores incluem a violência dentro de si e são sacrificiais.
Assim, a Igreja que tem dogmas ou doutrinas rígidas: nela funciona ainda a Inquisição com muitas vítimas. Assim, o mercado:os que não se integram, são expulsos.
Por isso há bilhões de excluidos, os que não prestam para o mercado.
O PT mostrou que pode ser diferente.
Mas vitimar militantes não o colocaria no mesmo nivel das instituições que expulsam?
Onde está diferença?
É possível sair deste impasse?
Sim, é possível desde que haja coragem de se confrontar com o caos e renunciar à acomodação fácil à ordem estabelecida.O caos sempre mete medo, pois obriga a transformações.
E há os que temem transformações, como os 55 que votaram pela expulsão dos dissidentes. Quem tem medo de Heloisa Helena?
Significa que não precisamos da ordem? Precisamos.
Mas a questão não é essa.
A questão é: como tratamos a ordem?
Como algo fechado ou aberto?
Se optarmos pelo fechado, iremos sempre vitimar e expulsar dissidentes em nome da ordem.
Se optarmos pelo aberto,haverá diálogo,transformações e uma ordem dinâmica.
Foi assim que surgiram todas as coisas no universo.
Se os peixes tivessem ficado sempre no mar (ordem fechada) não teriam surgido os seres humanos.
Foi preciso que um deles tivesse coragem, pulasse para a praia (ordem aberta) e lá ficado para que surgissem répteis, mamíferos e nós humanos.
O PT possui um capital político e ético inestimável e quadros lúcidos que podem suscitar estas questões e garantir que seja diferente.
Se mantiver uma compreensão fechada da ordem irá perder ainda mais gente e pensadores.
E quanto a você, Heloisa Helena: Você, minha irmãzinha, não teve medo.
Você representa o que deve ser.
E o que deve ser tem força própria.
Acabadas as lágrimas, dê-nos o sorriso dos libertos e em vez de amargura, a sua militância incansável ao lado da senzala "sin perder la ternura jamás".
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home